sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Cosmovisão

Quando menos esperamos, mesmo os livros que já sabiamos maravilhosos continuam a surpreender-nos.
Depois desta viagem tão para sul, e de estar na ilha do sul deste país do sul, revelou-se-me a cosmovisão desta personagem de romance, agarrada a uma aldeia imaginada ao sul de Portugal, no Barrocal Algarvio.

"Tudo parado. Carminha deixou-se estar. Para além das casas, a estrada. Para além da estrada, o mato. Para além do mato os figueirais, e as outras terras, e as outras ainda. Para além de todas as terras, o mar. Para além do mar o sul, e no caminho do sul mais extremo, o bojo da terra, e para além do bojo da terra. No fundo dos escuros, das noites e dos dias. Muito para além de tudo isso. Ainda para além do sul tão extremo, que já passa a ser norte em relação ao que ainda resta, nessa direcção. Dormirá o soldado, se ainda por essas bandas for hora de dormir. Porque lá. Dizem. Anda tudo ao contrário. As chuvas e o estio. O frio e o calor."

in Lídia Jorge, "O Dia dos Prodígios", EEA, p.96 .

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Pés descalços

A brisa desta primavera lembra-nos o Natal que se aproxima. Faz frio. Até os neo-zelandeses estranham, afirmando que a temperatura está mais baixa do que a que seria natural nesta época do ano. Mas insistem em usar calções, t-shirts e chinelos. Há mesmo alguns que, na velha tradição deste sul, se passeiam descalços! Têm os pés calejados com uma sola de pele encardida. Só de observá-los, fico com arrepios. Serão de frio ou de nojo?
Não sei de onde vem este hábito esquisito para descendentes de Britânicos. Talvez venha dos Maori, que já cá estavam há alguns séculos.
O Xico e eu, cada um com as suas coisas, tivemos mais um dia de trabalho. Apresentámo-nos calçadinhos. O programa da ave de bico torto foi adiado para a próxima 2ª feira. Lá iremos, de botas de campo.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Primeiras vistas das montanhas




Logo cedo, os colegas do Xico levaram-nos para as montanhas, para que conhecêssemos algumas das suas áreas experimentais, locais sujeitos a incêndios, matos e florestas nativas, espécies invasoras e plantações de exóticas. Explicaram tudo, mostraram o que puderam. E a meio da tarde, deixaram-nos em casa, banzados com este primeiro cheirinho de montanhas.

Amanhã, ao fim da tarde, outro colega quer levar-nos para uma das áreas de nidificação da tal ave do bico torto, vizinha da sua casa. Convidou-nos para jantar e para dormir lá. Voltaremos ao Campus pela manhã de 6ª feira.
Já estamos a perceber que nesta terra, tão aparentemente pacata, o coração bate mais depressa.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Inventário ornitológico

Os nossos leitores ornitólogos ou os que, não o sendo, gostavam dos nossos inventários ilustrados, podem ter agora uma grande desilusão. Aqui no Campus e em Christchurch, só encontrámos passarada introduzida: pardais, melros, tordos, estorninhos e pintassilgos são aqui as espécies exóticas. O resto não existe, ou é muito escasso. As únicas aves nativas que observámos até agora, eram gaivotas no centro da cidade, e comiam sobejos de uma refeição.
Mas haja esperança. Antes de regressarmos, aguardam-nos alguns passeios pela costa e alguns passeios pelas montanhas.
O Xico conheceu ontem um colega do Scion que estuda a única espécie de ave do Mundo que tem o bico torto. É aquática e usa-o para virar pedras. Pode ser que …
E onde está o kiwi? No meio de tantos “kiwis” (nome que os australianos chamam aos neo-zelandeses), não se encontrará um que tenha penas?

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Sonoda

Sonoda é a palavra japonesa que dá o nome ao conjunto de alojamentos onde nos encontramos. Também é ele que inspira o arranjo ajardinado que envolve os vários blocos de quartos e apartamentos, conferindo ao local uma beleza e tranquilidade muito especiais.

Ontem, passamos todo o dia a trabalhar em casa. Uma pequena paragem de manhã levou-nos a descobrir um pouco de calor do jardim. Uma pequena paragem à tarde levou-nos a uma sala comum dos alojamentos, com jogos, música e televisão. Mesmo estando destreinados, demos uns toques na mesa de ping pong.

Hoje, o Xico foi para o Scion (parceiros do projecto) e eu passei todo o dia na biblioteca. Mais uma fantástica biblioteca e mais um manancial de informação para explorar. Almoçamos juntos num restaurantezinho de comida indiana e chinesa, mesmo no meio do Campus. Excelentes os pratos que escolhemos: um curry de frango com manga; um mixed de vegetais com arroz frito.

Outro lugar, mais duas semanas. Apesar da beleza do local, e da oportunidade que estamos a ter, as saudades apertam bastante. Porque assim o sinto, ponho-me a trabalhar. Neste fim de dia, encontro algum consolo: porque li um ou dois livros muito relevantes para o meu trabalho, estou a andar com o projecto das paisagens literárias e soube que o meu artigo sobre a metamorfose foi aceite para publicação. É bom, não é?